Publicado em 09.07.2012
Imagine se o
cineasta George Lucas criasse uma religião com preceitos tão mirabolantes
quanto o enredo da série Guerra nas Estrelas. Ou se um guru de auto-ajuda
inventasse uma seita em que seus bestsellers seriam elevados a escrituras
sagradas. Imagine ainda uma junção dessas duas coisas. Pois algo bem parecido
existe: a Igreja da Cientologia, crença que conquistou celebridades como os
atores Tom Cruise, John Travolta e Juliette Lewis, o cantor de soul Isaac Hayes
e Lisa Marie Presley, filha de Elvis. A cientologia foi fundada nos anos 50
pelo americano L. Ron Hubbard, autor de livros baratos de ficção científica e
de obras de aconselhamento que alardeiam os poderes da mente. Morto em 1986, ele
pregava que o homem é um ser imortal com capacidades espirituais ilimitadas,
mas precisa "limpar" sua mente dos traumas que viveu nesta e em
outras encarnações para desenvolvê-la. A cientologia admite que seus adeptos
também sigam outras fés. Seu grande inimigo está em outro campo: são as idéias
de Sigmund Freud e da psiquiatria moderna. Ela condena, por exemplo, o uso de
remédios como os antidepressivos. Volta e meia, a religião entra na mira
da imprensa e das autoridades americanas. Já foi acusada de fazer lavagem
cerebral e explorar os fiéis. Mas a igreja conta com defensores em pontos tão
estratégicos quanto o mercado financeiro e o governo americano. Além, é claro,
de ter garotos-propaganda como Cruise. "A cientologia mostra como mudar
uma sociedade na qual as pessoas são ensinadas a odiar", disse o ator a
VEJA numa entrevista precedida por um tour de cinco horas pela sede mundial da
seita, em Hollywood.
A cientologia
tem 8 milhões de seguidores em 150 países, segundo seus líderes - há quem
estime, contudo, que o número não passa de 100.000. A maioria dos adeptos está
nos Estados Unidos, mas a igreja vem crescendo internacionalmente. Isso é
visível em eventos como a inauguração de sua nova sede na Espanha, no ano
passado, num grande edifício de Madri. Ou nos 137 centros de recuperação de
dependentes de drogas que a igreja mantém em 37 países - inclusive na periferia
de São Paulo, seu principal ponto de referência no Brasil. "A cientologia
tem pouco mais de cinqüenta anos e não pára de crescer. Por isso é
atacada", diz Lee Anne DeVette, irmã mais velha e relações-públicas de Tom
Cruise.
A cientologia se
define como uma religião que prega o uso do poder da mente para driblar
sofrimentos da vida moderna, como o estresse, a ansiedade, a agressividade e o
pessimismo. A prática é baseada na teoria Dianética, criada pelo pelo fundador
da cientologia, o escritor de ficção científica L. Ron Hubbarb, em 1954. A
seita acredita que o homem é um ser imortal que passa por diversas experiências
até atingir a iluminação. Críticos da cientologia a definem como uma
organização que vende serviços de autoajuda e livros sob a fachada de
religião.
O ator descobriu
a igreja no começo da carreira. Diagnosticado como disléxico na infância, ele
diz ter encontrado nela uma forma de superar o trauma. “É errado rotular
crianças com qualquer doença psicológica”, diz ele. Nos últimos tempos, Cruise
tem pautado suas aparições públicas pelo esforço de divulgar a cientologia — e
levar adiante seus ataques sistemáticos a Freud e à indústria farmacêutica. Já
discutiu por causa dela com dois repórteres da revista alemã Der Spiegel e com
o apresentador americano Matt Lauer. Numa entrevista, condenou a atriz Brooke
Shields por ter usado antidepressivos para tratar da depressão pós-parto (ela deveria
ter se tratado à base de exercícios e vitaminas, sugeriu). Recentemente, Cruise
voltou à carga numa entrevista à revista Entertainment Weekly. Sobre os livros
de cientologia se referirem à psiquiatria como uma “ciência nazista”, saiu-se
com esta: “Basta olhar a história. Jung (teórico da psicologia) foi editor de
um jornal nazista durante a II Guerra Mundial”. A revista consultou um
especialista na obra junguiana, Aryeh Maidenbaum, que qualificou de absurda a
afirmação. A associação entre a psicologia e o nazismo tem mesmo alto teor de
ridículo. Freud, afinal, era judeu e teve de fugir da Áustria para não cair nas
mãos dos seguidores de Hitler. Outro que já disse e fez bobagens por causa de
sua crença é John Travolta. Cinco anos atrás, ele protagonizou A Reconquista,
um dos filmes mais deprimentes de todos os tempos. Ficção científica sobre ETs
que escravizam os humanos, ele se baseia nas idéias da religião.
Lee Anne
ciceroneia pessoalmente os jornalistas que visitam o Celebrity Centre
International — o centro que ocupa um palacete que nos anos 30 foi um hotel que
abrigava estrelas de Hollywood. “Nossa intenção é mostrar a verdade sobre a
cientologia, já que a imprensa mundial tem nos interpretado mal”, diz ela. Lá,
os convidados têm de assistir a um DVD contendo um discurso do principal líder
da seita, David Miscavige. Miscavige fala da importância das ações da igreja na
educação, filantropia e direitos humanos. Discorre ainda sobre seu trabalho com
presidiários e suas guerras contra a indústria farmacêutica e as drogas. A
excursão pela sede da igreja inclui refeições agradáveis — e conversas idem com
seus ministros. A certa altura, o jornalista é convidado a avaliar seu nível de
stress. Ao fim do teste, um voluntário de plantão pergunta se a pessoa deseja
“se abrir” sobre seus problemas.
A cientologia
ostenta uma cruz como símbolo, mas esta nada tem a ver com o ícone cristão. Sua
versão do mito da criação também destoa das que foram consagradas pelas
religiões tradicionais — ela faz jus, e como, à imaginação de autor de ficção
científica de Hubbard. Resumidamente (a história tem detalhes obscuros,
guardados como “revelações” pela igreja), cada pessoa abrigaria em seu corpo
uma espécie de conglomerado de espíritos alienígenas — parte de uma população
de bilhões deles que teriam sido transportados para a Terra 75 milhões de anos
atrás, a mando de um líder intergaláctico maligno, Xenu. Essas entidades, que
Hubbard batizou de “thetans”, teriam perdido consciência de sua imortalidade ao
ganhar um invólucro indesejado — o corpo. A cientologia prega que só por meio
do aperfeiçoamento oferecido pela religião se podem retirar as travas que
impedem a evolução do espírito até sua plenitude — quando seria possível ter
controle absoluto sobre a mente.
Hubbard afirmava
que tudo o que ocorre de ruim na vida das pessoas fica arquivado naquilo que
ele denominou de mente reativa. Para a cientologia, essa é a fonte de problemas
como stress, ansiedade, depressão, agressividade e pessimismo. Uma das maneiras
de a religião ganhar adeptos é o uso do eletropsicômetro, ou e-meter, aparelho
que mede o stress com base numa tecnologia também usada em detectores de
mentiras. O usuário segura duas barras de ferro ligadas ao aparelho. Em tese, o
ponteiro do e-meter vaipara a direita ao detectar pensamentos estressantes.
Caso contrário, vai para a esquerda. O teste é aplicado diariamente em
passantes desavisados em lugares como a estação de metrô de Times Square, em Nova York. Uma vez
fisgados, os fiéis têm de vencer uma série de etapas de aperfeiçoamento — a
primeira é a desintoxicação química do corpo. Ocorre que os métodos da
cientologia são patenteados como se fossem segredos industriais. Para evoluir,
o fiel tem de fazer mais e mais cursos que chegam a custar milhares de dólares.
A igreja ameaça com processos quem divulga o conteúdo desses cursos. E avisa
que conhecer essas “revelações” de forma inadequada pode levar os incautos à
morte por pneumonia. Melhor ficar longe.
Proliferam
histórias de gente que teve de vender a própria casa para satisfazer sua
necessidade de freqüentar os cursos da seita. Registram-se episódios trágicos,
como o do jovem americano Noah Lottick, que cometeu suicídio aos 24 anos, na
década de 1990. Ele mergulhou do 10º andar de um hotel de Nova York sobre uma
limusine, tendo nas mãos 171 dólares — toda a quantia que lhe restou depois de
doar sua conta bancária à igreja. A seita é acusada de falsear dados para se
promover. Os cientologistas afirmam que Dianética, um manual de auto-ajuda de
Hubbard, foi best-seller durante quatro décadas. Há indícios, porém, de que a
própria igreja comprava a obra em grandes quantidades para mantê-la nas listas
dos mais vendidos. Descrito como um homem brilhante e iluminado, Hubbard na
verdade obteve um diploma falso de doutorado e teria concebido parte de suas
teorias sob o efeito de drogas e álcool. Depois de sua morte, ele foi submetido
a uma autópsia. Havia uma alta dose de calmante em seu sangue.
Fonte: VEJA 03/07/2012
Que viageeeeeem! É... o mundo precisa de Cristo!
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