terça-feira, 31 de julho de 2012
segunda-feira, 16 de julho de 2012
CIENTOLOGIA, UMA CRENÇA DE OUTRA GALÁXIA
Publicado em 09.07.2012
Imagine se o
cineasta George Lucas criasse uma religião com preceitos tão mirabolantes
quanto o enredo da série Guerra nas Estrelas. Ou se um guru de auto-ajuda
inventasse uma seita em que seus bestsellers seriam elevados a escrituras
sagradas. Imagine ainda uma junção dessas duas coisas. Pois algo bem parecido
existe: a Igreja da Cientologia, crença que conquistou celebridades como os
atores Tom Cruise, John Travolta e Juliette Lewis, o cantor de soul Isaac Hayes
e Lisa Marie Presley, filha de Elvis. A cientologia foi fundada nos anos 50
pelo americano L. Ron Hubbard, autor de livros baratos de ficção científica e
de obras de aconselhamento que alardeiam os poderes da mente. Morto em 1986, ele
pregava que o homem é um ser imortal com capacidades espirituais ilimitadas,
mas precisa "limpar" sua mente dos traumas que viveu nesta e em
outras encarnações para desenvolvê-la. A cientologia admite que seus adeptos
também sigam outras fés. Seu grande inimigo está em outro campo: são as idéias
de Sigmund Freud e da psiquiatria moderna. Ela condena, por exemplo, o uso de
remédios como os antidepressivos. Volta e meia, a religião entra na mira
da imprensa e das autoridades americanas. Já foi acusada de fazer lavagem
cerebral e explorar os fiéis. Mas a igreja conta com defensores em pontos tão
estratégicos quanto o mercado financeiro e o governo americano. Além, é claro,
de ter garotos-propaganda como Cruise. "A cientologia mostra como mudar
uma sociedade na qual as pessoas são ensinadas a odiar", disse o ator a
VEJA numa entrevista precedida por um tour de cinco horas pela sede mundial da
seita, em Hollywood.
A cientologia
tem 8 milhões de seguidores em 150 países, segundo seus líderes - há quem
estime, contudo, que o número não passa de 100.000. A maioria dos adeptos está
nos Estados Unidos, mas a igreja vem crescendo internacionalmente. Isso é
visível em eventos como a inauguração de sua nova sede na Espanha, no ano
passado, num grande edifício de Madri. Ou nos 137 centros de recuperação de
dependentes de drogas que a igreja mantém em 37 países - inclusive na periferia
de São Paulo, seu principal ponto de referência no Brasil. "A cientologia
tem pouco mais de cinqüenta anos e não pára de crescer. Por isso é
atacada", diz Lee Anne DeVette, irmã mais velha e relações-públicas de Tom
Cruise.
A cientologia se
define como uma religião que prega o uso do poder da mente para driblar
sofrimentos da vida moderna, como o estresse, a ansiedade, a agressividade e o
pessimismo. A prática é baseada na teoria Dianética, criada pelo pelo fundador
da cientologia, o escritor de ficção científica L. Ron Hubbarb, em 1954. A
seita acredita que o homem é um ser imortal que passa por diversas experiências
até atingir a iluminação. Críticos da cientologia a definem como uma
organização que vende serviços de autoajuda e livros sob a fachada de
religião.
O ator descobriu
a igreja no começo da carreira. Diagnosticado como disléxico na infância, ele
diz ter encontrado nela uma forma de superar o trauma. “É errado rotular
crianças com qualquer doença psicológica”, diz ele. Nos últimos tempos, Cruise
tem pautado suas aparições públicas pelo esforço de divulgar a cientologia — e
levar adiante seus ataques sistemáticos a Freud e à indústria farmacêutica. Já
discutiu por causa dela com dois repórteres da revista alemã Der Spiegel e com
o apresentador americano Matt Lauer. Numa entrevista, condenou a atriz Brooke
Shields por ter usado antidepressivos para tratar da depressão pós-parto (ela deveria
ter se tratado à base de exercícios e vitaminas, sugeriu). Recentemente, Cruise
voltou à carga numa entrevista à revista Entertainment Weekly. Sobre os livros
de cientologia se referirem à psiquiatria como uma “ciência nazista”, saiu-se
com esta: “Basta olhar a história. Jung (teórico da psicologia) foi editor de
um jornal nazista durante a II Guerra Mundial”. A revista consultou um
especialista na obra junguiana, Aryeh Maidenbaum, que qualificou de absurda a
afirmação. A associação entre a psicologia e o nazismo tem mesmo alto teor de
ridículo. Freud, afinal, era judeu e teve de fugir da Áustria para não cair nas
mãos dos seguidores de Hitler. Outro que já disse e fez bobagens por causa de
sua crença é John Travolta. Cinco anos atrás, ele protagonizou A Reconquista,
um dos filmes mais deprimentes de todos os tempos. Ficção científica sobre ETs
que escravizam os humanos, ele se baseia nas idéias da religião.
Lee Anne
ciceroneia pessoalmente os jornalistas que visitam o Celebrity Centre
International — o centro que ocupa um palacete que nos anos 30 foi um hotel que
abrigava estrelas de Hollywood. “Nossa intenção é mostrar a verdade sobre a
cientologia, já que a imprensa mundial tem nos interpretado mal”, diz ela. Lá,
os convidados têm de assistir a um DVD contendo um discurso do principal líder
da seita, David Miscavige. Miscavige fala da importância das ações da igreja na
educação, filantropia e direitos humanos. Discorre ainda sobre seu trabalho com
presidiários e suas guerras contra a indústria farmacêutica e as drogas. A
excursão pela sede da igreja inclui refeições agradáveis — e conversas idem com
seus ministros. A certa altura, o jornalista é convidado a avaliar seu nível de
stress. Ao fim do teste, um voluntário de plantão pergunta se a pessoa deseja
“se abrir” sobre seus problemas.
A cientologia
ostenta uma cruz como símbolo, mas esta nada tem a ver com o ícone cristão. Sua
versão do mito da criação também destoa das que foram consagradas pelas
religiões tradicionais — ela faz jus, e como, à imaginação de autor de ficção
científica de Hubbard. Resumidamente (a história tem detalhes obscuros,
guardados como “revelações” pela igreja), cada pessoa abrigaria em seu corpo
uma espécie de conglomerado de espíritos alienígenas — parte de uma população
de bilhões deles que teriam sido transportados para a Terra 75 milhões de anos
atrás, a mando de um líder intergaláctico maligno, Xenu. Essas entidades, que
Hubbard batizou de “thetans”, teriam perdido consciência de sua imortalidade ao
ganhar um invólucro indesejado — o corpo. A cientologia prega que só por meio
do aperfeiçoamento oferecido pela religião se podem retirar as travas que
impedem a evolução do espírito até sua plenitude — quando seria possível ter
controle absoluto sobre a mente.
Hubbard afirmava
que tudo o que ocorre de ruim na vida das pessoas fica arquivado naquilo que
ele denominou de mente reativa. Para a cientologia, essa é a fonte de problemas
como stress, ansiedade, depressão, agressividade e pessimismo. Uma das maneiras
de a religião ganhar adeptos é o uso do eletropsicômetro, ou e-meter, aparelho
que mede o stress com base numa tecnologia também usada em detectores de
mentiras. O usuário segura duas barras de ferro ligadas ao aparelho. Em tese, o
ponteiro do e-meter vaipara a direita ao detectar pensamentos estressantes.
Caso contrário, vai para a esquerda. O teste é aplicado diariamente em
passantes desavisados em lugares como a estação de metrô de Times Square, em Nova York. Uma vez
fisgados, os fiéis têm de vencer uma série de etapas de aperfeiçoamento — a
primeira é a desintoxicação química do corpo. Ocorre que os métodos da
cientologia são patenteados como se fossem segredos industriais. Para evoluir,
o fiel tem de fazer mais e mais cursos que chegam a custar milhares de dólares.
A igreja ameaça com processos quem divulga o conteúdo desses cursos. E avisa
que conhecer essas “revelações” de forma inadequada pode levar os incautos à
morte por pneumonia. Melhor ficar longe.
Proliferam
histórias de gente que teve de vender a própria casa para satisfazer sua
necessidade de freqüentar os cursos da seita. Registram-se episódios trágicos,
como o do jovem americano Noah Lottick, que cometeu suicídio aos 24 anos, na
década de 1990. Ele mergulhou do 10º andar de um hotel de Nova York sobre uma
limusine, tendo nas mãos 171 dólares — toda a quantia que lhe restou depois de
doar sua conta bancária à igreja. A seita é acusada de falsear dados para se
promover. Os cientologistas afirmam que Dianética, um manual de auto-ajuda de
Hubbard, foi best-seller durante quatro décadas. Há indícios, porém, de que a
própria igreja comprava a obra em grandes quantidades para mantê-la nas listas
dos mais vendidos. Descrito como um homem brilhante e iluminado, Hubbard na
verdade obteve um diploma falso de doutorado e teria concebido parte de suas
teorias sob o efeito de drogas e álcool. Depois de sua morte, ele foi submetido
a uma autópsia. Havia uma alta dose de calmante em seu sangue.
Fonte: VEJA 03/07/2012
segunda-feira, 9 de julho de 2012
ALERTA APOLOGÉTICO
Modismos neopentecostais ultrapassam barreiras do
protestantismo
Algumas
igrejas evangélicas, conhecidas como igrejas neopentecostais, ultrapassaram as
barreiras da esfera do protestantismo e as estão à beira do caminho da heresia,
afirma um apologista cristão. O pastor João Flávio Martinez, presidente do
Centro Apologético Cristão de Pesquisas traz à tona a questão das igrejas que
“na teoria tem confissão de fé evangélica, mas na prática se assemelham mais a
uma seita”.
Em uma
pregação Martinez fala sobre os modismos pentecostais, citando alguns nomes de
líderes conhecidos de âmbito nacional como o bispo Edir Macedo, missionário RR
Soares, Sônia e Estevam Hernandes, entre outros.
Igrejas como a
Igreja Mundial do Poder de Deus (IMPD) também são apontadas como possuindo
práticas e ensinamentos que são estranhas ao Evangelho. O apologista afirma que
o líder desse movimento chegou a colocar Jesus no nível de “criatura”.
“Muita gente
pela tradição da religião, não entende a historia de Jesus. Alguns falam de natal,
mas ninguém sabe o dia exato em que Jesus Cristo nasceu. Segundo que Jesus já
existia muito antes de tudo. Ele é a imagem do Deus invisível, a encarnação do
verbo.Mas ele não é sempiterno, é eterno. O pai que é Deus é sempiterno, aquele
que antes dele nunca existiu como ele, nem existirá depois dele, sempre existiu
e sempre existirá. A primeira obra dele foi Jesus Cristo...”, citou João Flávio
ao Valdemiro como falando em um de seus estudos bíblicos (veja aqui), ao The
Christian Post.
Segundo o
apologista isso é fruto da falta de embasamento teológico que fundamenta esses
movimentos, das quais ele chama de "movimentos
contraditórios".Martinez ainda alerta que eles (tais movimentos como a da
IMPD) tem transformado a Igreja Brasileira em uma instituição que preza mais a
criatura que o Criador, ou seja, que serve mais ao homem e menos a Deus.
“Os crentes
são de vida espiritual supérflua e sem profundidade. A maioria das práticas de
igrejas como essa não passa de ‘macumba evangélica’ e não cristianismo
Bíblico.”
Pastor João
Flávio urge que os fiéis “procurem uma igreja bíblica, fundamentada nos
princípios da Reforma, fundamentada em Cristo e na sua Palavra”. “Procurem o
evangelho da Cruz e não o evangelho do diabo travestido de culto aos anjos. É
preciso que os que querem servir Jesus entendam que Deus nos chama para a
fidelidade e não para o hedonismo”, afirmou com indignação ao CP.
Postagem extraída do site:
http://www.creio.com.br/2008/noticias01.asp?noticia=18816
segunda-feira, 2 de julho de 2012
A BÍBLIA NA RIO + 20
A Bíblia é uma coletânea de fatos e palavras
que, conforme a fé das comunidades judaicas e cristãs, contêm revelação do amor
de Deus pela humanidade. Porém, o cenário ideal do jardim onde o homem habita
só foi chamado de “paraíso” nas versões medievais. Originalmente, nem o mundo
foi criado por acaso, nem o homem. Este é um ser criado em permanente busca de
identidade e sentido, mas a existência humana não é solitária, nem
independente. O homem não está só, faz parte e está sujeito relacionalmente com
o restante da criação. O resumo aponta: “ele não existe sem as demais
criaturas”. Adam é filho de “adamah”. Filho da terra (Gn 2,7). Um rio brota do
jardim para irrigar o jardim, o Éden é paráfrase da terra toda. A observação
desse Universo não confirma o determinismo pretendido em nossos dias. E nem
mesmo o pragmatismo pós-tecnológico.
A narrativa bíblica não levanta questionamentos
sobre a existência do ser Criador, sua origem e razões que o levaram a criar o
cosmo. Leis naturais rígidas não conferem com o cenário da criação, onde o
pressuposto do Iluminismo é que cada astro, cada estrela, cada componente,
funciona como um relógio, uma máquina movida por um combustível inesgotável e
perpétuo. Alterado o projeto original pelo homem (Gn 3,17), que ousa interferir
na originalidade da criação, este passará a ser juiz do bem e do mal. Arcará
com as consequências: “E Yahweh-Deus expulsou o homem do jardim onde fora
colocado. Baniu-o e colocou anjos como seguranças para impedi-lo de entrar”.
Podemos compreender, portanto, que os autores do grande poema da criação já
entendiam as intenções do homem de corromper a terra, enquanto corrompia-se a
si mesmo pela ganância.
Com Andrés Queiruga, devo convencer-me de que as
aparências, os significados do momento atual, inundado de informações
científicas e teorias sobre o planeta Terra, devem ser reavaliados. A
cosmovisão bíblica primitiva foi adulterada ao extremo, e nós somos os agentes
racionais que dela nos distanciamos e, quando olhamos para traz, embora exista
considerável diversidade de manifestações míticas, culturas conservadas dos
muitos povos que interpretaram suas origens nos muitos lugares deste Planeta.
Não vejo porque não ouvirmos as vozes que vêm de lá. A essência de um mito não
é regida pela razão, mas pela consciência da importância do sagrado, o homem e
o universo. Como utopia teológica, o Reino de Deus, consequentemente, e a
justiça ambiental, formam moldura e quadro para um mundo novo possível.
Os sentimentos neles contidos, porém, como se
encontra, refletem uma comunhão que abrange tanto os seres humanos como os
demais seres da natureza. Tanto animados como inanimados. Natureza e mundo humano
se fundem e se inter-relacionam. Humanos se veem como humanos, animais se veem
como animais? Não. E os elementos como a Água e a Terra, como se veem? A
Criação geme em dores de parto até agora (Rm 8,22). “Se geme, porque é
violentada, podemos ouvir os seus gemidos?”, pergunta Walter Saas.
É exacerbada a importância da natureza, quando
desviada para o bem-estar artificial. Turismo ecológico, por exemplo. Por que
necessitamos de celulares multifuncionais, capazes de fotografar belezas
incríveis no meio da floresta, se eles não atendem às necessidades dos milhões
que padecem da fome, das endemias, da exclusão? Lemos informes científicos
populares, e só vemos deslumbramento sobre a era pós-tecnológica. O Ocidente,
campeão das novas tecnologias, prossegue na globalização da miséria enquanto
sustenta a acumulação de bens como panaceia de salvação. E não poupa o planeta,
depreda-o enquanto vai esgotando suas riquezas naturais, como a água.
Privilegiados no uso das tecnologias para o conforto e bem-estar existentes são
apenas 25 %, provavelmente, dos 7 bilhões de habitantes do planeta. O caminho
certo é, evidentemente, também reduzir ao máximo a emissão desses gases
poluentes, substituindo os motores movidos a petróleo por outros, movidos à
eletricidade. Não acreditamos que alguém, em sã consciência, se oponha a isso,
em acordo com Ferreira Gullar.
A dificuldade, portanto, não está aí e, sim, na
substituição dos seres vivos por máquinas poluidoras. Leiamos, “substituição do
ser humano pelos sonhos de consumo deste século”. Oferecem bem-estar localizado
para ricos, tecnologias eletrônicas avançadas, saúde e medicina de alto preço,
educação para postos de trabalho privilegiados, lazer de alto custo e alcance
territorial. Porém, há 5,5 bilhões de deserdados ameaçados pela barbárie
tecnocrática e 2 bilhões morrem de fome e brevemente perecerão de sede se a
contaminação ou esgotamento de mananciais formados através de milhões de anos
prosseguirem no ritmo atual.
O capitalismo alcançou a água, mas cooptou, como
sempre, na história do mundo, a religião que defende o lucro e resultados
financeiros. Tudo é produto de mercado. Tudo se vende. Tudo é feito mercadoria.
Tudo é consumível. Faz-se muito dinheiro também com a religião, como se a
parábola das moedas escondidas resumisse o Reino de Deus. Não é a toa que a
recente força evangélica pentecostal que mais influencia a religião histórica
dedica-se tão intensamente à mídia e ao potencial mercadológico das multidões.
A massificação religiosa dá lucro.
É preciso olhar para o chão, portanto. O Planeta
se torna cada vez mais inviável. O atual modelo de desenvolvimento, apoiado no
sistema liberal capitalista e na orientação que se dá aos conhecimentos
científicos, aponta para uma determinada visão de homem, da natureza e da
razão. Desenvolvimento sem sustentação da biodiversidade. Em última instância,
a causa primeira está no antropocentrismo ocidental, certamente ajudado por uma
inadequada interpretação da tradição judaico-cristã, que tende a fazer do ser
humano mais um “dominador” e explorador da Criação, do que seu “guardião”.
Seria melhor dizer “jardineiro”. Enquanto isso, justifica-se a interpretação
espiritualista abstrata como uma “queda de braço” com Deus. O homem perde, mas
se vinga destruindo a criação (cf. início).
A questão, portanto, não pertence ao mundo da
técnica, mas ao mundo da ética. Estamos diante de uma questão antropológica.
Bíblica? Certamente, porque há uma tradição libertária, do homem e da terra,
ali refletida, que nos acompanha desde quatro milênios. A sobrevivência do
homem está na pauta das lutas ecológico-ambientais. Nas palavras de Edgar
Morin: “urge uma nova Antropologia, bem como uma nova Teologia, capaz de
restaurar o ser humano no conjunto da obra da Criação”. Uma nova racionalidade
que integre as ciências, inclusive a espiritualidade inteligente voltada para o
planeta, e outros tipos de razão, é bem-vinda. A Humanidade e a Criação total
agradecerão. A cordialidade, o cuidado com o ser humano total e o mundo criado,
a compreensão ecumênica da salvação do planeta, estão na pauta da
espiritualidade ecológica em absoluta prioridade.
A Bíblia é uma coletânea de fatos e palavras
que, conforme a fé das comunidades judaicas e cristãs, contêm revelação do amor
de Deus pela humanidade. Porém, o cenário ideal do jardim onde o homem habita
só foi chamado de “paraíso” nas versões medievais. Originalmente, nem o mundo
foi criado por acaso, nem o homem. Este é um ser criado em permanente busca de
identidade e sentido, mas a existência humana não é solitária, nem
independente. O homem não está só, faz parte e está sujeito relacionalmente com
o restante da criação. O resumo aponta: “ele não existe sem as demais
criaturas”. Adam é filho de “adamah”. Filho da terra (Gn 2,7). Um rio brota do
jardim para irrigar o jardim, o Éden é paráfrase da terra toda. A observação
desse Universo não confirma o determinismo pretendido em nossos dias. E nem
mesmo o pragmatismo pós-tecnológico.
A narrativa bíblica não levanta questionamentos
sobre a existência do ser Criador, sua origem e razões que o levaram a criar o
cosmo. Leis naturais rígidas não conferem com o cenário da criação, onde o
pressuposto do Iluminismo é que cada astro, cada estrela, cada componente,
funciona como um relógio, uma máquina movida por um combustível inesgotável e
perpétuo. Alterado o projeto original pelo homem (Gn 3,17), que ousa interferir
na originalidade da criação, este passará a ser juiz do bem e do mal. Arcará
com as consequências: “E Yahweh-Deus expulsou o homem do jardim onde fora
colocado. Baniu-o e colocou anjos como seguranças para impedi-lo de entrar”.
Podemos compreender, portanto, que os autores do grande poema da criação já
entendiam as intenções do homem de corromper a terra, enquanto corrompia-se a
si mesmo pela ganância.
Com Andrés Queiruga, devo convencer-me de que as
aparências, os significados do momento atual, inundado de informações
científicas e teorias sobre o planeta Terra, devem ser reavaliados. A
cosmovisão bíblica primitiva foi adulterada ao extremo, e nós somos os agentes
racionais que dela nos distanciamos e, quando olhamos para traz, embora exista
considerável diversidade de manifestações míticas, culturas conservadas dos
muitos povos que interpretaram suas origens nos muitos lugares deste Planeta.
Não vejo porque não ouvirmos as vozes que vêm de lá. A essência de um mito não
é regida pela razão, mas pela consciência da importância do sagrado, o homem e
o universo. Como utopia teológica, o Reino de Deus, consequentemente, e a
justiça ambiental, formam moldura e quadro para um mundo novo possível.
Os sentimentos neles contidos, porém, como se
encontra, refletem uma comunhão que abrange tanto os seres humanos como os
demais seres da natureza. Tanto animados como inanimados. Natureza e mundo humano
se fundem e se inter-relacionam. Humanos se veem como humanos, animais se veem
como animais? Não. E os elementos como a Água e a Terra, como se veem? A
Criação geme em dores de parto até agora (Rm 8,22). “Se geme, porque é
violentada, podemos ouvir os seus gemidos?”, pergunta Walter Saas.
É exacerbada a importância da natureza, quando
desviada para o bem-estar artificial. Turismo ecológico, por exemplo. Por que
necessitamos de celulares multifuncionais, capazes de fotografar belezas
incríveis no meio da floresta, se eles não atendem às necessidades dos milhões
que padecem da fome, das endemias, da exclusão? Lemos informes científicos
populares, e só vemos deslumbramento sobre a era pós-tecnológica. O Ocidente,
campeão das novas tecnologias, prossegue na globalização da miséria enquanto
sustenta a acumulação de bens como panaceia de salvação. E não poupa o planeta,
depreda-o enquanto vai esgotando suas riquezas naturais, como a água.
Privilegiados no uso das tecnologias para o conforto e bem-estar existentes são
apenas 25 %, provavelmente, dos 7 bilhões de habitantes do planeta. O caminho
certo é, evidentemente, também reduzir ao máximo a emissão desses gases
poluentes, substituindo os motores movidos a petróleo por outros, movidos à
eletricidade. Não acreditamos que alguém, em sã consciência, se oponha a isso,
em acordo com Ferreira Gullar.
A dificuldade, portanto, não está aí e, sim, na
substituição dos seres vivos por máquinas poluidoras. Leiamos, “substituição do
ser humano pelos sonhos de consumo deste século”. Oferecem bem-estar localizado
para ricos, tecnologias eletrônicas avançadas, saúde e medicina de alto preço,
educação para postos de trabalho privilegiados, lazer de alto custo e alcance
territorial. Porém, há 5,5 bilhões de deserdados ameaçados pela barbárie
tecnocrática e 2 bilhões morrem de fome e brevemente perecerão de sede se a
contaminação ou esgotamento de mananciais formados através de milhões de anos
prosseguirem no ritmo atual.
O capitalismo alcançou a água, mas cooptou, como
sempre, na história do mundo, a religião que defende o lucro e resultados
financeiros. Tudo é produto de mercado. Tudo se vende. Tudo é feito mercadoria.
Tudo é consumível. Faz-se muito dinheiro também com a religião, como se a
parábola das moedas escondidas resumisse o Reino de Deus. Não é a toa que a
recente força evangélica pentecostal que mais influencia a religião histórica
dedica-se tão intensamente à mídia e ao potencial mercadológico das multidões.
A massificação religiosa dá lucro.
É preciso olhar para o chão, portanto. O Planeta
se torna cada vez mais inviável. O atual modelo de desenvolvimento, apoiado no
sistema liberal capitalista e na orientação que se dá aos conhecimentos
científicos, aponta para uma determinada visão de homem, da natureza e da
razão. Desenvolvimento sem sustentação da biodiversidade. Em última instância,
a causa primeira está no antropocentrismo ocidental, certamente ajudado por uma
inadequada interpretação da tradição judaico-cristã, que tende a fazer do ser
humano mais um “dominador” e explorador da Criação, do que seu “guardião”.
Seria melhor dizer “jardineiro”. Enquanto isso, justifica-se a interpretação
espiritualista abstrata como uma “queda de braço” com Deus. O homem perde, mas
se vinga destruindo a criação (cf. início).
A questão, portanto, não pertence ao mundo da
técnica, mas ao mundo da ética. Estamos diante de uma questão antropológica.
Bíblica? Certamente, porque há uma tradição libertária, do homem e da terra,
ali refletida, que nos acompanha desde quatro milênios. A sobrevivência do
homem está na pauta das lutas ecológico-ambientais. Nas palavras de Edgar
Morin: “urge uma nova Antropologia, bem como uma nova Teologia, capaz de
restaurar o ser humano no conjunto da obra da Criação”. Uma nova racionalidade
que integre as ciências, inclusive a espiritualidade inteligente voltada para o
planeta, e outros tipos de razão, é bem-vinda. A Humanidade e a Criação total
agradecerão. A cordialidade, o cuidado com o ser humano total e o mundo criado,
a compreensão ecumênica da salvação do planeta, estão na pauta da
espiritualidade ecológica em absoluta prioridade.
Derval Dasilio
É
pastor da Igreja Presbiteriana Unida do Brasil e autor do livro “O Dragão que
Habita em Nós” (2010).
Postagem extraída do site: http://www.ultimato.com.br/conteudo/a-biblia-na-rio-20
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